A perna mecânica de Roberto Carlos

     

       O grande mistério da perna mecânica de Roberto Carlos passaria despercebido se não fosse Roberto Carlos. Eu não tenho dúvida que ele tem uma perna mecânica.

       E o que tem isso de mais?

       Nada, se não fosse Roberto Carlos.

      Até hoje, ele não fala no assunto. É um direito dele. Mas eu me pergunto: quantas pessoas ele ajudaria se falasse em público desse problema físico?

      Eis a questão.

      O livro “Roberto Carlos em Detalhes”, do escritor Paulo Cesar Araújo (foto abaixo) foi proibido de ser vendido. Na verdade, ele começou a ser vendido, mas o cantor entrou na justiça para proibir a circulação por se tratar, dentre outras coisas, de invasão à privacidade, etc... Mas na internet...

     Em 2009, postaram uma fotomontagem do músico com a perna mecânica. Convencia quem visse a foto, (logo abaixo).  O acidente é verdadeiro ou dá muitos indícios disso. Primeiro; ele tem uma música de nome “Divã” (a letra está no final deste artigo) que detalha características do acidente e que coincide com o trecho do livro proibido que conta a história. Segundo; em todos os filmes do cantor, bem como em suas aparições, ele NUNCA aparece de bermuda, já notaram? E olha que teve filmes gravados na orla marítima, dirigindo seu conversível em dias muito quentes no Rio de Janeiro! Terceiro e último; seria muito difícil para ele assumir isso ou seria imensa dificuldade em superar o trauma?

 

     Mas e aí?

     Fico pensando como seria da mais alta magnitude se ele, sim, dissesse a todos em alto e em bom som que tem uma perna mecânica e que isso não foi um entrave para conquistar o que conquistou. Seria um exemplo contra a discriminação que até hoje vinga no Brasil contra os deficientes ou contra os que têm “necessidades especiais”, como queiram.

    Depois disso, aí sim, eu posso chamá-lo de “Rei”.

Trecho do livro de Carlos Araújo que narra o acidente de Roberto Carlos quando criança

     Por volta de nove e meia da manhã, Zunga e Fifinha pararam numa beirada entre a rua e a linha férrea para ver o desfile de um grupo escolar. Enquanto isso, atrás deles, uma velha locomotiva a vapor, conduzida pelo maquinista Walter Sabino, começou a fazer uma manobra relativamente lenta para pegar o outro trilho e seguir viagem.

     Uma das professoras que acompanhava os alunos no desfile temeu pela segurança daquelas duas crianças próximas do trem em movimento e gritou para elas saírem dali. Mas, ao mesmo tempo em que gritou, a professora avançou e puxou pelo braço a menina, que caiu sobre a calçada. Roberto Carlos se assustou com aquele gesto brusco de alguém que ele não conhecia, recuou, tropeçou e caiu na linha férrea segundos antes de a locomotiva passar.

     A professora ainda gritou desesperadamente para o maquinista parar o trem, mas não houve tempo. A locomotiva avançou por cima do garoto que ficou preso embaixo do vagão, tendo sua perninha direita imprensada sob as pesadas rodas de metal. E assim, na tentativa de evitar a tragédia com duas crianças, aquela professora acabou provocando o acidente com uma delas.

     Diante da gritaria e do corre-corre, o maquinista Walter Sabino freou o trem, evitando consequências ainda mais graves para o menino, que, apesar da pouca idade, teve sangue-frio bastante para segurar uma alça do limpa-trilhos que lhe salvou a vida. Uma pequena multidão logo se aglomerou em volta do local e, enquanto uns foram buscar um macaco para levantar a locomotiva, outros entravam debaixo do vagão para suspender o tirante do freio que se apoiava sobre o peito da criança.

     Com muita dificuldade, ela foi retirada de debaixo da pesada máquina carregada de minério de ferro. “Eu estava ali deitado, me esvaindo em sangue”, recordaria Roberto Carlos anos depois numa entrevista. Mas naquele momento alguém atravessou apressado a multidão barulhenta e tomou as providências necessárias. “Será uma loucura esperarmos a ambulância”, gritou Renato Spíndola e Castro, um rapaz moreno e forte, que trabalhava no Banco de Crédito Real.

     Providencialmente, Renato tirou seu paletó de linho branco e com ele deu um garrote na perna ferida do garoto, estancando a hemorragia. “Até hoje me lembro do sangue empapando aquele paletó. E só então percebi a extensão do meu desastre”, afirma Roberto, que desmaiou instantes após ser socorrido. Esse momento trágico de sua vida ele iria registrar anos depois no verso de sua canção O Divã, quando diz: “Relembro bem a festa, o apito/ e na multidão um grito/ o sangue no linho branco…”, numa referência à cor do paletó que Renato Spíndola usava no momento em que o socorreu. (…)

     Naquela mesma manhã, no hospital da Santa Casa, o médico aplicou uma anestesia local de novocaína no acidentado e deu início à cirurgia. (…)

     Na época, em casos semelhantes, era comum fazer a amputação da perna acima do joelho, prática mais rápida e segura. Mas Romildo tinha acabado de ler um estudo americano sobre ciência médica que explicava que os membros acidentados devem ser cortados o mínimo possível. Assim, a amputação da perna do garoto foi feita entre o terço médio e o superior da canela – apenas um pouco acima de onde a roda de metal passou. Essa providência fez com que Roberto Carlos não perdesse os movimentos do joelho direito e pudesse andar com mais desenvoltura

 

Letra da música O Divã

 

O Divã

Roberto Carlos

Relembro a casa com varanda
Muitas flores na janela
Minha mãe lá dentro dela
Me dizia num sorriso
Mas na lágrima um aviso
Pra que eu tivesse cuidado
Na partida pro futuro
Eu ainda era puro
Mas num beijo disse adeus.

Minha casa era modesta, mas
eu estava seguro
Não tinha medo de nada
Não tinha medo de escuro
Não temia trovoada
Meus irmãos à minha volta
E meu pai sempre de volta
Trazia o suor no rosto
Nenhum dinheiro no bolso
Mas trazia esperança.

Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Por isso eu venho aqui.

Relembro bem a festa, o apito
E na multidão um grito
O sangue no linho branco
A paz de quem carregava
Em seus braços quem chorava

E no céu ainda olhava
E encontrava esperança
De um dia tão distante
Pelo menos por instantes
encontrar a paz sonhada.

Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Por isso eu venho aqui.

Eu venho aqui me deito e falo
Pra você que só escuta
Não entende a minha luta
Afinal, de que me queixo
São problemas superados
Mas o meu passado vive
Em tudo que eu faço agora
Ele está no meu presente
Mas eu apenas desabafo
Confusões da minha mente.

Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Essas recordações me matam.